Qual afinal a diferença entre o terror e o suspense. Muitos filmes são enquadrados nas duas categorias por diferentes críticos e publicações e acabam confundindo o espectador. Na verdade, o que diferencia o terror de seu gênero co-irmão seria simplesmente visual. O Suspense apela para a cumplicidade ou a apreensão da platéia. É o não saber o que há atrás da porta, mas não ser surpreendido pelo susto. Ou, mais comumente, é saber o que há atrás da porta ( e por isso não ser surpreendido ) enquanto o protagonista, inocente, caminha em direção a ela. O suspense é trabalhar os nervos, enquanto o terror, além de expor o susto e o medo apela mais para o visual. Vago, sim. É por isso que muitos filmes ainda poderiam ser enquadrados em qualquer um dos dois. Caso de O Bebê de Rosemary, por exemplo. Trata-se de um grande filme de terror, e de um excelente suspense.
A história do terror no cinema começou quando se percebeu o poder do cinema de trabalhar as emoções dos expectadores de forma segura. Quando o público percebeu que poderia sentir sustos e medo, mas sem perigo, gostou da brincadeira. Que outra forma de arte poderia proporcionar dar vazão a lendas, contos e horrores que habitavam o imaginário popular desde séculos atrás, alimentado pela cultura popular e pela literatura? É a máxima dos sentidos: o ser humano gosta de emoções fortes. O terror seria a montanha russa do cinema, onde ele grita, o coração dispara, mas no fim, ele sabe que sairá inteiro. Afinal, é apenas um filme.
Seria possível dividir a história do gênero em partes distintas. A Gênese do Terror, a Era dos Grandes Monstros, O Terror Underground e a escassez da metade do século, onde os comunistas e os alienígenas fizeram pequenas produtores crescerem explorando um filão deixado de lado pelas grandes produtoras, a era de ouro do gênero, os anos 70, onde a produtora inglesa Hammer reinou absoluta e os melhores filmes do gênero foram realizados em Hollywood e a era do terror explícito e de efeitos, iniciada nos anos 80. E é sobre cada uma dessas etapas que vamos mostrar a história do terror.

A gênese do terror, realmente, ocorreu em 1919 através das mãos do alemão Robert Wienne e o clássico O Gabinete do Dr. Caligari. Marco do expressionismo alemão, o filme é considerado o primeiro filme de terror da história. Ao lado dele, três filmes podem entrar na galeria dos responsáveis pelo nascimento do gênero: um ano depois, John Barrymore apavorou platéias do mundo inteiro numa impressionante cena de transformação em O Médico e o Monstro. Foi um dos primeiros filmes do gênero feito nos Estados Unidos. Alemanha e Estados Unidos continuaram criando os melhores filmes, columinando no clássico Nosferatu, de Murnau ( uma versão do diretor alemão para a história de Drácula, uma vez que ele não conseguiu os direitos autorais da família do escritor. Murnau seria processado por plágio após o lançamento do filme ) e em O Fantasma da Ópera, que eternizou Lon Chaney no papel do atormentado Erik, que assombra a ópera de Paris e idolatra a cantora Christine. Uma tragédia de horror cuja cena do desmascaramento do deformado Erik entrou para a história e assustou as platéias pela impressionante maquiagem.

Estabelecido o gênero e confirmada a aceitação do público, quem começou a dar as cartas nos anos seguintes foi a Universal. O estúdio americano criou uma galeria de monstros que marcaram a história do cinema e dominaram o gênero por anos a fio. Esse domínio começou com dois clássicos absolutos no mesmo ano: Drácula, de Tod Browning e Frankenstein, de James Whale, ambos de 1931. É bem verdade que, apesar do sucesso, o filme de Browning hoje soa ultrapassado, enquanto o de Whale ainda tem muito a mostrar. Drácula é uma versão extremamente teatral e não muito fiel ao espírito do livro de Stocker, que envelheceu sobretudo pela interpretação pesada de Bela Lugosi, mas que por muito tempo estabeleceu o padrão para vampiros no cinema. Já Frankenstein conseguiu captar o espíritop do romance original de Mary Shelley e eternizou Boris Karloff no papel do monstro. Nos anos seguintes, Lon Chaney, Bela Lugosi e Boris Karloff se revezariam no imaginário popular como os maiores astros do gênero.

Muito melhor do que Dracula e bem mais apavorante foi Freaks (1932) de Browning, trazendo o circo de aberrações humanas reais. Com Charles Laughton no papel do Dr. Moreau, The Island of Lost Souls (1932) foi a primeira grande adaptação do romance de HG Wells. No mesmo ano, Boris Karloff interpretaria A Múmia no filme homônimo e se tornaria o maior astros do gênero. Voltaria a interpretar seu mais famoso personagem em filmes como A Noiva de Frankenstein ( para alguns superior ao original ), Son of Frankenstein e outros. Lobisomem se tornou um clássico na pele de Lon Channey mas possivelmente é um dos mais fracos filmes da época visto hoje. Ainda assim, assustou o público quando lançado. Em 1939, Charles Laughton interpretaria Quasimodo no clássico O Corcunda de Notre Dame, versão várias vezes transposta para as telas do romance de Victor Hugo.

Durante os anos 30 e 40 a Universal reinou, mas aos poucos os monstros foram cansando o público. A guerra terminou, a guerra fria se iniciou a havia um monstro pior à espreita: o comunista. Na mesma época se inicia a onda dos discos voadores e havia um novo filão e uma nova mensagem a explorar: os piores monstros vinham do espaço e para muitos analistas eles eram a própria encarnação do comunismo. Isso abriu espaço para que pequenas produtoras explorassem o filão deixado de lado pelos grandes estúdios. Sobretudo na europa, surgiram os diretores chamados de "contrabandistas" que, por escassez de recursos, trabalhavam a atmosfera de seus filmes e conseguiam, sem monstrar seus vilões e monstros, criar o medo na platéia. O mais notável desses nomes foi o de Jacques Torneur, autor do clássico Sangue de Pantera ( refilmado por Barbet Schroeder como A Marca da Pantera, com Nastassja Kinski ).

Demorou alguns anos, da metade do século, para que o gênero ressurgisse com força, principalmente nos Estados Unidos. Em 1961, Deborahh Kerr fez parte da vitoriosa adaptação de A Volta do Parafuso",de Henry James, em "Os Inocentes". Mas foi somente em 1968 que o gênero daria seu grande salto de qualidade. Primeiro devido à criatividade de George Romero, que com atores amadores e poucos recursos ( filmando apenas à noite por economia e tempo útil dos envolvidos ) fez de A Noite dos Mortos Vivos um cult que ficou durante décadas sendo exibido nos cinemas após a meia noite. iniciou a moda dos mortos-vivos em voga principalmente nos anos 80 e permanece um clássico. Já nos Estados Unidos, Roman Polansky apavora o mundo com a história de uma jovem inocente que carrega no útero o anti-cristo, com a conivência do marido e dos vizinhos, membros de uma seita satãnica. O Bebê de Rosemary torna-se por merecimento um dos maiores filmes do gênero em todos os tempos, grande exemplo de horror psicológico. Os anos 70 trazem os melhores filmes que o gênero criou, entre eles O Exorcista (73) de William Friedkin, talvez o mais famoso filme do gênero, O Massacre da Serra Elétrica (75), filme de horror B que conquistou uma legião de admiradores, Carrie, a Estranha (76), adaptação fiel do romance de Stephen King dirigida por Brian DePalma que revelou Sissy Spacek, e A Profecia (76) de Richard Donner, perturbadora visão da vinda do anti-cristo de enorme sucesso entre o público. Nessa época, a produtora inglesa Hammer lançou O Conde Drácula e tornou Cristopher Lee a própria visão do personagem em uma série de outros filmes, alguns de baixa qualidade, outros bons, mas sempre atraindo o público e tornando-se cult na televisão.

Com a chegada dos anos 80, surge o chamado horror explícito. Talvez o marco inicial tenha sido feito por um estudante de cinema chamado Sam Raimi, que com um grupo de amigos filmou, em 83, A Morte do Demônio ( Evil Dead ) mostrando um grupo de jovens que encontra o livro dos mortos numa cabana isolada na floresta e liberam as forças do demônio. Nada de sutilezas: horror explícito, repugnante e com movimentos de câmera inovadores. Antes do horror explícito de Raimi, Kubrick, com O Iluminado (80) criaria uma obra-prima interpretada com tal magnificência por Jack Nicholson que o personagem acabaria estigmatizando o ator. John Landis, em 1981, talvez tenha sido o primeiro a juntar com sucessos terror e humor sarcástico em Um Lobisomem Americano em Londres, criando o chamado terrir. Lobisomens invadiram mesmo as telas em 81. Joe Dante lançou no mesmo ano Grito de Horror, outro ótimo filme sobre o tema, que lhe abriu as portas para dirigir Gremlins, em 1984, sob os olhos de Steven Spielberg. Dante não era novo no gênero: em 79 ele parodiou Spielberg e seu Tubarão lançando Piranha. Nos filmes seguintes, ele acabaria abandonando o terror e enveredando mais para a fantasia e a ficção. Spielberg deu sua contribuição ao gênero nesse início de década. Escreveu a história e chamou Tobe Hooper para dirigir Poltergeist. Apesar da direção de Hooper, o filme é de Spielberg. O terror começava a mesclar efeitos visuais como forma de chamar a atenção de platéia, tomada pelo assombro do crescimento das técnicas de efeitos de outros gêneros. Ao longo dos anos 80, a temática principal foi chamar a atenção do público adolescente, o maior consumidor do gênero. É por isso que filmes como A Hora do Pesadelo, A Hora do Espanto, Sexta-Feira 13 e Halloween ( iniciado com um grande filme de John Carpenter em 1978 ) tem como atores grupos de adolescentes, vítimas de monstros do sono, vampiros modernos ou psicopatas assassinos que invariavelmente ressurgiam em intermináveis continuações. essa acabou sendo a tônica do cinema de horror nos anos 90 também. Enquanto personagens famosos surgidos nos anos 80 definhavam junto ao público, como Freddy Krueger, Jason e Chucky, de Brinquedo Assassino, e nomes como os de Wes Craven e John Carpenter lutavam para tentar recuperar o talento perdido, os adolescentes voltaram a se ver no papel de vítimas. E a gostar. Foi Wes Craven, depois de muito tempo sem um bom filme, que reavivou a temática com a série Pânico. Logo vieram as imitações: Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado, Lenda Urbana e até Halloween - 20 Anos Depois, aproveitando a moda. Difícil dizer o que será do terror agora, no novo milênio. Afinal, nada mais assusta o público, já anestesiado após a avalanche visual que fez o mais feio dos monstros deixar de provocar medo. Talvez o caminho esteja mesmo em tornar o terror psicológico o centro das atenções - ou tratar o gênero de maneira diferente. Francis Ford Coppola adaptou Drácula de Bram Stocker de forma fiel em 1992 e construiu uma obra-prima. Não provoca medo, mas a qualidade da produção tornou o filme um sucesso. Outras superproduções como A Casa Amaldiçoada decepcionaram. Com um públicocom opções tão distintas, talvez o caminho seja tratar o gênero não como um produto para causar medo. Até porque o público dificilmente sentirá sabendo dos poderes da indústria cinematográfica em forjar a realidade - e não será por isso que o horror psicológico e amador de A Bruxa de Blair fez tanto sucesso??


Criada por Fábio Luis Rockenbach - 2001

Especial

Os Melhores Terror da história do cinema